quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Estudo em perspectivas, ou Obra aberta com conseqüências

O Coletivo Ambulante foi convidado pela Fab Aliceda, uma das idealizadoras do site SER Urbano, para participar da ocupação artístico-filosófica do espaço urbano, no Galpão do Viaduto João Moura em São Paulo, em evento nomeado Ser Humano Ente Urbano.
A ação do Coletivo aconteceu no último sábado, dia 13 de novembro, no final da tarde de um dia frio e chuvoso, que nos lembrava mais outono que primavera, reforçando a natureza que nosso Haikai predizia:

Sopra o vento de outono
Estamos vivos e podemos olhar-nos
Você e eu

Sobre essas três linhas, breves e sintéticas de um estado epifânico, nos debruçamos. Foi esse Haikai o principal detonador do work in progress de 13 de novembro. Nós, ambulantes, para ocupar o espaço urbano escolhemos uma bússola que nos incitava ao silêncio, à presença, à respiração, à relação (consigo próprio, com o outro, com o tempo). Enfim, chegamos à pergunta-chave: Como criar plasticamente um espaço-tempo para o presente do presente, olhar verdadeiramente o outro, e estar ali?
É sempre difícil dizer exatamente quando começa e quando termina as ações do Coletivo. São algumas as razões, mas falarei de uma: porque nossos corpos estão muito disponíveis à passagem do cotidiano para o extra-sensível, vamos borrando esse limiar a um ponto tal que quando menos percebemos, ZUM, estamos no galpão em busca do gesto preciso, do impulso genuíno, e ZUM, estamos em casa comendo pizza e decidindo quem irá comprar a garrafa de vinho. É claro que é possível lentificar esse processo e esmiuçar cada fotograma dessa experiência, mas essa perspectiva de estudo não será abordada aqui.

ZUM, estamos no galpão:
num primeiro momento reconhecendo o espaço, as obras dos outros artistas que estão ali, as pessoas começam a chegar, vamos nos apropriando de cadeiras, de mesas, dos objetos que levamos, janela, balde, vinho, começamos a nos apropriar de nós mesmos, a temperatura interna do corpo se modifica, existe calor, os ruídos se intensificam, mãos transpiram, dentre os objetos temos a pemba, escrevemos no chão, uma frase de Artaud, e depois outra, vai se formando um círculo, sabemos que temos uma ou outra pessoa nesse círculo conosco, é um círculo quase invisível, pois ele não está delineado no espaço, mas sim numa conexão interna de presença se fazendo em ato, mãos nos cabelos, vento nos cabelos, olhares, corpo que dança, corpo que se entrega ao chão, escuto no meu ouvido “a vida que levamos é a vida que pensamos”, quem me disse isso não foi uma pessoa do Coletivo, a ação já entrou no corpo de alguém, alguém já se sente parte, e outra moça escreve no chão, e outra também, um rapaz sorri, uma mulher sorri, vai ficando escuro, tem silêncio, tem olhares, tem uma banda que começa a ensaiar acordes, recolhemos objetos, outra mulher se torna parte, segue caminhando conosco, rua, garoa, deixamos o galpão, carro, de parte em parte esboçamos um todo,
e ZUM, estamos em casa pedindo pizza.

Os diversos traços e fragmentos desta ação não se esgotam em uma narrativa, a palavra não dá conta de tudo. Louvado seja o homem e sua complexa teia de possibilidades de agir no mundo e de dizer do mundo.

Fab Aliceda, foi um prazer a experiência de ocupar por duas horas o galpão. Grata pelo convite querida.

Plagiando Artaud e trocando o sujeito, escrevi no chão do galpão O SER URBANO É COMO UM ATLETA DO CORAÇÃO.

Que cada um que participou ou se fez presente nesta ocupação possa ter vivido uma acalorada bombeada no próprio coração. Os ambulantes saíram quentes, e esta é uma boa conseqüência, intensifica o caminho.

Flávia Tavares.















2 comentários:

  1. Flávia,
    Suas belas e precisas palavras me fizeram voltar ao dia da Ação e (re)ver de outro ângulo, talvez da cobertura de um apartamento de luxo.

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  2. só agora q vi este post!!!! linnnndo!
    q saudade de todos!
    como andam as reuniões? alguma em sampa? quero aparecer!!!!
    bjo fab

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